domingo, 7 de setembro de 2014

Pequeno quarto - ao som de Arnaldo Baptista

Era uma manhã fria de agosto, na solidão e aconchego do pequeno quarto, as paredes, o tempo e o espaço, se transmutam em uma mistura de distorção, cores, sentidos novos. É confuso, mas não entender faz parte das novas sensações.
Sentia-se como um desprendimento. A realidade, às vezes, age como um grilhão. É o peso. É irônico: sair desse jugo é tão leve e ao mesmo tempo tão intenso, tanto quanto o peso jamais será.
Essa leveza parecia estática, mas também movimento. Ou algo entre as duas coisas. É difícil perceber. O movimento às vezes é de tudo ao redor enquanto se está parado. Talvez um terceiro estado da relação de posição entre corpos para o qual não exista ainda uma palavra.
O som parecia luz, a luz parecia som. O ar estava mágico, os contornos de tudo ligeiramente borrados e luminosos. Não fazia a menor diferença olhos abertos ou fechados. Nada fazia diferença, tampouco semelhança de algo.

...

Um turbilhão.

Uma respiração te traria à realidade. Espere. Mais um pouco...

Cuidado. O labirinto de Minus pode as vezes ser traiçoeiro e nos confundir. Não perca a corda amarrada na saída. Ou a trilha de pão.

Mais um. Erga os braços e aproveite a descida. Sem medo, aproveite porque é emocionante, é como a primeira descida da montanha russa, mas para todas as direções.


Respiração funda. Saliva descendo a garganta. O tato de novo reaparece. Agora já reconhecível a posição do corpo, as paredes, o teto... Uma era inteira se passou. Mas agora os sentido percebem que não passou mais de um minuto ou dois, pois foi apenas o tempo exato de um solo de órgão de Arnaldo Baptista.

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