terça-feira, 24 de maio de 2011

Sexo, nossa cura




To sentindo ultimamente, de maneira inconsciente,
que o mundo simplesmente anda meio bagunçado
parece que a inércia inlfuencia nossa mente
que todo mundo consente em não parar de ficar parado

Sonho tá virando rima
a morte virando menina
o futura tá virando a esquina

a noite tá virando almoço
homem de terno tá virando moço
minha boca beija o seu pescoço (ops!)

Tem índio até incendiando a prefeitura
e o sexo sendo a nossa cura
ser livre é não ser mais que um exercício da loucura
e o sexo sendo a nossa cura

Beleza, tristeza, pobreza
agora é papo de maluco
Raul, maracatu, eles e tu
agora é um bando de maluco
sendo assunto de escola, sendo objeto de estudo

Economista virando poeta
tem carro até virando bicicleta
e toda hora sendo a hora certa
(agora é a hora hein!)

Tem índio até incendiando a prefeitura
e o sexo sendo a nossa cura
ser livre é não ser mais que um exercício da loucura
e o sexo sendo a nossa cura


Senhor F.
Participação mais que especial: André Andere

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Juízo



Já não me cabe ser perfeito
eu já cansei de me esforçar
eu vou mostrar do que eu sou feito
te dar a verdade só pra variar



Sei que as vezes o certo é estreito
sei que sobra voz, sei que falta o peito
sei que ser perfeito sempre foi tentado
mas de tanto tentado é que nunca foi feito


Se me compro ou te consumo
se eu fico ou se eu sumo
se eu não sei se não, eu não sei por quê



Se estagno ou se decolo
se sorrio ou preciso de colo
nós não somos eu, nem somos você






Tento ser assim como se dissesse:
Ai meu deus! Um deus sem “d” e sem “s”
de tanto se promete logo a gente se esquece que:
Liberdade Se Demora levantar, Logo Se Desaparece



Não vou me sentir sozinho
se você seguir seu caminho
não digo que sim, nem que não, nem preciso
tudo bem, pode ir, vá com deus!



e juízo...

Os Lírios



Os Lírios

Alinho o aluguel da minha lucidez
alienado eu sou
alheio a tudo isso, eu não ligo, passo a vez, aplaudindo a quem ficou
aliendado eu sou
Altero o alcance da minha estupidez
aumento a minha dor
Eu acato as decisões que o acaso me impõe
aliendado eu sou

A sorte me visitava só pra rir de mim, veio cortar as relações
o devaneio veio aqui e rompeu percepções
e o azar veio somar-se às minhas equações
nublar concepções
O acaso repetia à risca sempre o mesmo resultado
o azar não joga dados onde eu os possa ver
e eu hoje acho graça, faça o que se faça
o futuro é uma charada que eu não posso responder

Eu adoro o inesperado, o impossível, o intocável, inconscientemente
me fascina tanto quanto me estressa a rotina que nubla minha mente
inesperado, inteligível, até inimaginável, memorável,
mas não é tudo que se sente

Parece que o passado nunca passa por aqui
pareço descuidado, distraído, alienado,
eu sei que sou assim, já faz parte de mim,
o acaso é debochado e me acompanha até o fim
alienado eu sou, é tudo que restou,
revejo os meus conceitos de uma vida que mudou
a sorte acabou, alienado eu sou

Shakespeare e o malabarista

Ele estava sentado, e já fazia tempo demais para a pequena paciência com que havia acordado. Burocracia. Como odiava escritórios. O ambiente mais opressor possível, símbolo do desperdício das potencialidades humanas. Olhava a atendente por detrás da mesa, ela com seus olhos fixos no papel, enquanto o ruído do lápis se desfazendo parecia ensurdecê-lo. Os ponteiros do relógio pareciam dele zombar, passando mais devagar do que o de costume.
Deixou sua mente divagar por um pequeno instante, olhando o sol lá fora, notando a cor mais forte que a grama exibia naquela manhã. Reparou, no canto direito da janela, um elemento a mais na visão distante: um malabarista treinava manobras com uma bola de vidro brilhante, que refletia os raios de sol e parecia feita de luz. O diretor dos movimentos da bola parecia a ela ligado, enquanto suas mãos deslizavam pelo ar parecendo mal tocar a bola de luz que quase flutuava. Os cabelos desgrenhados e soltos, a barba ligeiramente grande, as roupas coloridas, as pulseiras e o colar cabalístico davam à cena um ar peculiar demais para se descrever apenas com palavras.
Novamente, ele olha por cima da mesa. Parece que está mais longa, ele portanto está mais distante da atendente, que agora olha para tela de um computador. Parece mais querer ignorá-lo do que executar alguma função enquanto lê a tela. Ele fecha os olhos, inclina de leve a cabeça e coça o olho, a cena típica de cansaço mental. Sente-se desperdiçando-se naquela cadeira; desperdiçando a si mesmo.
Ele então escuta palavras sussurradas, ditas em um ritmo suave. Olhando para a mesa ao lado, ele vê outra atendente, uma jovem japonesa, não mais de dezoito anos. Seus cabelos lisos caíam de leve nos olhos. Seu sorriso era tímido, mas parecia conter mais do que apenas esse aspecto de sua personalidade. Debruçado, com os cotovelos em sua mesa, estava o autor das palavras sussurradas: um garoto jovem como ela, de pele tão clara que parecia ser sensível ao sol, contrastando forte com seus cabelos e olhos totalmente escuros. Seus traços do rosto eram desenhados em linhas suaves, com um óculos discreto também de linhas finas e suaves. Parecia deliciar-se enquanto segurava um livro aberto diante de si: poemas de Shakespeare. Lia para ela em inglês, depois, sem ler, o recitava traduzido. Olhava-a nos olhos, e recitava bem baixo, para não romper o silêncio ensurdecedor daquele escritório; este direito era reservado apenas aos telefones que tocavam a cada cinco minutos.
Ele tenta escutar alguma frase do poema, mas a cena o encanta, e ele não consegue distinguir bem as palavras. Impossível não pensar em como frases de Shakespeare soltas no ar voavam pelo escritório, em como o malabarista lá fora manipulava a bola de vidro cheia de energia, e em como a atendente sequer pisca diante da tela, ignorando completamente a vida ao seu redor.
A atendente a sua frente retira uma papel, carimba-o com mais força do que o necessário, assina um visto rápido e lhe entrega. Ao sair da sala, pensa se Shakespeare já escreveu algum poema sobre um malabarista. Ou sobre um casal no local de trabalho, que trocam olhares fugidios e poemas sussurrados com sorrisos. Não. Talvez Shakespeare tenha escrito apenas uma crônica a respeito.

Realidades no Plural



"Acho que eu o vejo tocar. Talvez imerso em luz colorida. Ele no órgão, olhando para o outro, tocando guitarra, e ela cantando. É sinestésico, é envolvente, é colorido, é inebriante.”



Exagero? Quem te garante…?



É, acho que existe um outro mundo, rapaz. Talvez uma outra dimensão. Talvez não, com certeza, mas não a absoluta. Cara, diziam os filósofos que a realidade não é nada mais do que informações enganosas dos nossos sentidos. Platão falava do mito da caverna, lembra? Se eu falasse em Matrix, talvez te fizesse rir, certo?
Mas, ignore a ficção e tente responder o mais sinceramente possível à questão central do filme: se você estivesse num sonho e não conseguisse acordar, como saberia a diferença entre o mundo real e o mundo dos sonhos? São as velhas questões de volta.
É, acho mesmo que existe um meio de se acessar uma outra realidade, dimensão, o que for não importa, e ver tudo do modo como descrevi. Você, infelizmente, nunca vai saber do que se trata, mas saiba que muito do que você conhece e gosta foi feito assim, por pessoas assim. Eram tão parte dessa “outra dimensão” de que falo, que foram considerados gênios. Alguns eram tão de lá que parecem que fizeram o caminho inverso: vieram de lá pra cá, como foi o caso agora. Outros ficam por lá mais tempo do que por aqui, curiosíssimo não?
Não se trata apenas de um efeito, meu caro, mas uma forma de acesso à outra realidade ainda por desvendar, algo simplesmente tão fantástico que fica difícil descrever, e sinto em dizer que tais experiências são simplesmente intransferíveis. Triste verdade, não?
Agora, digo mais especificamente da música, é algo simplesmente fantástico, mas de um acesso muito restrito. Estranhou? Acredito que ouvir música muita gente ouve, mas sentir a música tão profundamente que até os sentidos táteis não se comparam à sensação produzida, isso já é ligeiramente mais raro. Que bom que ainda acontece hoje em dia, pois já cheguei a acreditar que talvez a música estivesse morta e que só restavam as heranças do passado. Estou em vias de rever essa posição, ainda não me decidi a respeito.
Ah, não mudemos de assunto, certo. Aliás, quer saber? Assunto encerrado. Não vou ficar mais argumentando, por três motivos. Primeiro, não quero mesmo mudar sua opinião, sou pouco samaritano nesse sentido e admito. Segundo, porque você deve ter notado que uso muitos “talvez” quando falo (se quiser, volte e conte no texto, mas esse entre aspas não conta). Isso demonstra que sou uma pessoa de pouca certezas e acho isso uma virtude. Diz uma frase do Raul: “você não tem perguntas pra fazer porque só tem verdades pra dizer”, e assino embaixo. E finalmente, terceiro, você está me fazendo perder a melhor parte da música!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Modernidade




Momento diferente, escuro e entorpecente

presentes e ausentes a normalidade

e a nossa banalidade

mas lá fora, na babilônia dessa cidade

tudo flui acelerado, sinto o mal estar da modernidade

tudo flui acelerado, é a modernidade

Baudelaire já me dizia, é a modernidade




Ao meu redor tento imaginar uma natureza, que talvez não exista

E quem pode me julgar, me chamar de idealista?

O futuro veio e me levou cativo

e parece ter passado o tempo das revoluções

Sob regras que eu não criei eu vivo

e tento me consolar num mercado de ilusões


E tento me consolar na modernidade...









PS: A primeira metade da primeira estrofe foi escrita coletivamente por um grupo de geógrafos ilhados numa república durante o última grande blecaute em São Paulo. As conversas daquela noite, o som que fazíamos, as pessoas, tudo isso inspirou a composição dessa música.

Se um dia eu descorbir como postar arquivos no blog, posto essa música.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

No Trabalho

Sabe aqueles dias em que você acorda inquieto? Você não quer passar o dia sentado numa cadeira de escritório. Nada te tira da cabeça que a vida é mais do que isso.Você então respira fundo, se espreguiça na cadeira, bebe a décima caneca de café do dia, buscando um pouco de felicidade no açúcar. Claro que não encontra. E a cafeína só serve pra te deixar mais inquieto, com vontade de sair correndo apenas e simplesmente. Mas não o faz. Fica olhando pra caneca de café enquanto esfria.
Vamos lá. Volte ao trabalho. Não porque você queira que seu departamento realize mais, não que faça algum sentido lutar por algo que você nem sabe ao certo se concorda, nem mesmo que você ache que sua função é necessária pra que as coisas funcionem. Não é. Nada parece fazer sentido, mas voltar ao trabalho ajuda a passar o tempo mais rápido.
No trabalho, o tempo se arrasta.
Não, não fique olhando pro relógio. Assim o tempo passa ainda mais devagar. É, é muito tempo da vida pra se perder aqui. O dia lá fora está lindo. Num dia de 24 horas, dormimos oito e trabalhamos oito, todo o resto fazemos nas outras oito. Nosso tempo curto é dividido em três partes eqüitativas, dormir, trabalhar e o resto da sua vida. Um terço da vida, passaremos trabalhando, outro dormindo. São apenas doze horas em média de sol por dia. Menos as oito de trabalho que são durante o sol, vezes uma vida toda, dá.......... A matemática me deprime mais que a falta de sol.
Agora pare de ficar olhando esse cursor piscar na tela. Faça algo. Faça logo porque até eu estou ficando desesperado aqui só de ficar assistindo você, ridiculamente inquieto e ridiculamente quieto.
Sim, agora sim. Andar até o fim do corredor, abrir a janela, sentir um pouco do dia que se passa lá fora sem você. Andar desperta, o dia refresca, e você quer estar consciente no seu algo a realizar.
Talvez o último. Talvez porque, antes de atingir o chão, ainda passe em alguns segundos toda sua vida diante dos seus olhos. Não sei ao certo se isso é verdade, minha experiência de quase-morte não teve direito a flash back, então comecei a desconfiar dessa história.
Mas faça o que tem que fazer. O que importa são os fatos. A tal paixão dos suicidas sem explicação. Como não tem explicação? Olhe a sua volta. Que lugar deprimente, imerso numa sociedade sem sentido, o sol lá fora não dava a cara a três dias e agora que ele está lá você não pode sentí-lo.
Não pode, não pode, não pode.
Convenções sociais, controle. Como não tem explicação?

...

Nossa. Não é que ele pulou mesmo?

Crônica do Cronista




Ele estava parado, diante do computador. Olhava para a tela e pensava em escrever uma crônica.


A crônica que estava em sua cabeça era a seguinte: ele teria uma vizinha, que conheceria todos os seus gostos musicais devido ao hábito dele de escutar música alta. Ele a encontraria no elevador, levando lixo reciclável. Então, ela comenta sobre o evento de agosto dos fãs de Raul em São Paulo e pergunta se ele vai. Ele questiona o porquê da pergunta e os dois entrariam num debate musical acerca de Raul Seixas com base nas informações trocadas via paredes de vizinho. O texto seria de frases curtas e rápidas a là Fernando Veríssimo, temperado com piadas internas para os bem fãs de Raul, causando aquela sensação de identidade com o texto. A crônica seria mesmo um sucesso.


Então ele saiu até a escada de incêndio, ao ar livre, e pensava em sua crônica, no que escreveria. Deixou-se levar pela paisagem e pela brisa suave daquela noite; estava fria, porém extremamente convidativa, por ironia. Com seus sentidos aguçados e suas percepções ampliadas, em boa parte devido a visão magnífica da São Paulo noturna vista daquela altura, viu-se imerso no ambiente com todos os modos possíveis de percebê-lo. De pensar em crônicas, pensou na pessoa do cronista. Tantas visões são possíveis, como uma cronista pode retratar uma só realidade se existem tantas? E se o cronista tiver mais de uma visão da realidade, ou não ter, mas ter consciência de que sua realidade é apenas um pequeno ponto de vista, ditado por seus enganosos sentidos limitados? Em poucos segundos, esqueceu-se totalmente da idéia original da crônica e passou a olhar, da escada de incêndio, a cidade iluminada. De quantas formas é possível pintá-la em um quadro? E em um poema ou uma crônica? Enxergamos todos a mesma coisa? Como se confirmar isso...? Será que existe alguma pessoa que é capaz de perceber mais de um tipo de realidade ao mesmo tempo? Acho que isso geraria um terceira, não? Aliás, não acredito que esse tipo de coisa siga nosso sistema de catalogação por unidades indivisas, usado para contar bois ou figurinhas. Talvez exista um número certo de realidades, mas talvez seja um número que não pode ser expressado ou abstraído pela mente humana, pois somos incapazes de percebê-lo e torná-lo uma idéia. Ou talvez não existam os números. Número existe?


O pensamento seguinte foi o mais óbvio: por que de pensar em crônica, pensou em cronista e de cronista, nas suas possíveis visões, e de suas visões às dimensões da existência? Como podem ser tortuosos os caminhos que o cérebro traça as vezes... Aliás, tudo, no fim, é apenas uma trilha de nosso cérebro, um impulso elétrico. Sim, nosso acesso à realidade se dá por meio de sentidos, que mandam sinais elétricos para o cérebro e esses sinais percorrem caminhos do sistema nervoso. Porém, e se em vez de ele utilizar os caminhos habituais, ele usar outras vias para se chegar ao mesmo destino, seriam os objetos percebidos da mesma maneira?


No fim, não teve dúvidas. Entrou, sentou-se, e escreveu. Fez uma crônica sobre o cronista: esta crônica.