segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Posteridade I

A tela em branco é algo angustiante. O maço de cigarro descansava sobre a escrivaninha. E ele odiava a falta da correção da ortografia. Ouvia Feira Moderna e sentia que estava em outra época, outro contexto, era palpável.


Todos os dias acordava no meio da noite, fumava um cigarro olhando os filmes que nunca havia assistido, sentado na cama, passava as mãos sobre o rosto, e tentava dormir, fracassando mais uma vez.


Não conseguia ouvir uma música até o fim, era impulso, quando estava quase acabando, mudava rápido, mesmo que fosse para repetir, era estranho, não era para acabar, não podia acabar, ah, sim, ele possuia sério problemas com os finais, quaisquer que fossem.


Era necessário uma continuidade eterna, mesmo que a idéia de infinito lhe gerava expressões de tédio, ah, mentira que a face tenta nos contar, qualquer sinal de término já o assustava, amedrontava, então, o moço procurava sempre uma maneira de trazer o passado à tona.


Nada era deixado, era sempre um fluxo, inúmeras cordas que uniam o passado ao presente, tantas deturpações, tantas memórias inventadas, mas eram lembradas todos os dias, em meio a tanta nostalgia patética, eram cultuadas, altares e fotografias, papel de chocolate e flores de plástico, tudo, era tudo preservado por um medo irracional de se perder no universo.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Sentado no carro

Ler ao som de: And I love her, versão de Rita Lee


Para Ana e Pedro.



Mágico. Impressionante entrar em contato com algo tão mágico. É realmente incrível, te faz questionar o conceito de mágica, não? Mágica é, por definição, uma forma de distorcer a realidade, correto? Acredito que a música tem, absolutamente, esse mesmo potencial. Em certos momentos, o êxtase musical altera completamente a realidade ao nosso redor. Por que não definir como algo mágico?



Sinto-me intensamente absorvido.



Assim, com os fechados, seu corpo se flexionava ao ritmo das batidas de rock psicodélico que saíam das caixas de som. Sentado no banco de trás de um carro, sentia seu interior imergir, movimentar, como se quase saísse do corpo. Sua mente não pensava, não pensava em absolutamente nada. Talvez fossem precisos muitos meses de exercícios de ioga para se obter tamanho esvaziamento mental. Era como se tudo que passasse por sua mente fosse uma onda, uma torrente, de algo que ele não podia descrever, e quando poderia?



Só sabia que era luminoso, que vinha em velocidade e a tudo perpassava, em ritmo musical. Intenso, tanto que depois os deixava cansados. Sentados estavam ele, ela. Ao lado dela, sentava o garoto por ela definido de “lisérgico”. Estranha coincidência?

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Liberte-se de Suas Diretrizes



Uma das coisas mais importantes que aprendi ao longo do tempo é que na vida existe uma multiplicidade de paradigmas para tudo. Coisas que você viu, ouviu e aprendeu durante a infância, acha que é o correto, sempre achou natural e de direito, tratam-se de pontos de vista, a maioria de bem pouco tempo atrás.


Na verdade não é assim em todas as partes do mundo. Nem sempre foi assim no passado daquele mesmo lugar. Não é assim para as outras pessoas. Na verdade, o mundo em que você vive é bem peculiar. É a sua apropriação individual do que é a realidade. Não bastasse isso, a realidade coletiva é igualmente peculiar.


Os paradigmas que consideramos como direito natural, na verdade são fruto de um passado recente. Propriedade privada, os países constituídos em Estados, todo nosso modo de viver e conceber isso, são produtos do século XIX, e há quem diga que jamais fomos modernos. Nosso projeto de sociedade, a declaração de direitos humanos universais, tantas coisas e ideias que hoje vigoram, não são mais velhas que a segunda guerra mundial. É impressionante abandonar o mundo particular da infância e adentrar a fase contestatória da adolescência, quando percebemos outros mundos, passamos a questionar os fundamentos daquilo que nos impõem. Não pude entender na adolescência contestatória, contudo, o caráter relativo e subjetivo da ciência e do conhecimento. De como as informações que temos sobre o mundo são recentes, e poucas. Não sabemos mais do que sabemos se quer saber (me perdoe o trocadilho, como disse, estou ficando velho).


O que mais me chamou atenção, certamente, foram os novos paradigmas para arte. Acostumei-me a um estilo de pintura e escultura, uma certa literatura, ao normal demais, e a determinados paradigmas musicais. Descobrir a arte abstrata significou para mim entender o que se passou na cabeça do artista, e sentir a sensação que ele tentou imprimir na obra. As novas formas de narrar na literatura, os novos assuntos discutidos e nunca dante pensados. Concluí que a arte gera sensações diversas e intensas, que atinge a todos os tipos de público.


O ser humano é diverso. Sua realidade cultural tão plural está nas mais variadas formas de organizar a vida social, o trabalho, a cultura, espalhadas nas mais variadas paisagens do planeta. Aos poucos descobrimos que o outro pode ser muito diferente de nós, seja ele estrangeiro ou vizinho. Mudar as diretrizes e paradigmas. A Metamorfose Ambulante.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

"Memórias" do IFCHstock

É forte. Como se a imaginação se confundisse à realidade. Talvez como fusão entre as duas.


Imagino-me de vários ângulos e passo a me enxergar nesses ângulos, como se estivessem “trocando a câmera”. Preciso prestar muita atenção para perceber em que posição me corpo está de fato; isso somado ao movimento cria um efeito espetacular. Contudo, de olhos fechados, é muito mais difícil perceber a posição (ou qualquer outra coisa, diga-se). As vezes meus olhos fechados fazem parecer que estou em movimento quando na verdade estou parado; quando escuto música e fecho os olhos, parece que meu corpo vibra e se mexe conforme a música, mas estou novamente parado: quando olho para minhas mãos, vejo toda a imagem do meu corpo saindo de foco, mas ainda do ritmo da música, como pequenas vibrações que distorcem a visão e a devolvem ao normal em alternância, e no tempo da música. Sinto-me como um mostrador digital de um equalizador.


Consigo sentir pelo tato as vibrações das grandes caixas de som. Quando me ponho em movimento de fato, minha mente trabalha tantas variáveis que já não leva conta tantas outras, e o que resta (tudo o que retenho) é a música. Olho a banda no palco. Verde, vermelho e prata, cores belíssimas, um show de luzes e cores; realmente, os caras sabem tocar, tanto no sentido técnica quanto no sentido empolgação. Mal posso acreditar que estão tocando “Jardim elétrico”.


A cada explosão da bateria e do baixo sinto que algo explode por dentro em mim, uma vibração ou energia estranha, como se algo tentasse transbordar.


Depois saio andando. Algo está diferente: tudo parece inclinado uns cinco graus para esquerda. Além disso, tudo parece se mexer no mesmo ritmo dos seus passos, o que dificulta um pouco a caminhada, mas a deixa interessante. Descendo pelo corredor, ele avista um grupo de hippies, vendendo artesanato e frutas orgânicas. O ambiente tinha uma energia boa, eles sorriam e conversavam. Quando me aproximo, vejo a garota das bananas, sentada de pernas cruzadas e usando roupas largas e coloridas. Tinha olhos de um azul profundo, os cabelos escuros, um sorriso encantador. Sem pensar, pergunto:


“Você é um anjo?”


Ela ri. Compro duas bananas orgânicas, e comento que estava justamente procurando bananas. Assim que falo isso, uma outra garota compradora aparece e diz a mesma coisa (que estava a procura de bananas). Acho que a vendedora entendeu que era um anjo no sentido de estar vendendo justamente o que eu procurava, mas entendeu também que talvez eu falasse do seus olhos angelicais. Em nenhum dois casos ela viu maldade e nem eu, era apenas um elogio sincero.


Continuei descendo, a vagar pelos corredores do prédio. Estava totalmente imerso no mundo da minha mente, que fluía livre pelos estímulos dos arredores. Ao fim do caminho, percebi que estava longe, havia saído e estava agora em um lugar que já me era muito familiar. Deitei na grama em baixo de uma árvore onde podia ver um ninho de corujas. Estava vazio e completamente silencioso.


Pego o isqueiro e acendo um cigarro. Meu corpo e minha mente parecem girar enquanto sinto o relaxamento. Fico olhando as corujas enquanto uma pequena nostalgia feliz atravessa minha mente. Impressionante eu ter ido parar em um lugar onde, semanas antes, estivera ali naquele gramado com amigos, em condições semelhantes.


Voltei ao anfiteatro de arena onde os outros estavam deitados. Deitei e fiquei a observar as estrelas. Novamente, parecia estar pousando depois de ter atravessado um túnel.

Voltando pra casa

As palavras saíam soltas. Pensava que as esqueceria, e de fato foi. Contudo, lembra de ter sido extremamente sincero consigo mesmo. Ele achava que o último sunshine havia dividido sua vida entre antes e depois. Intenso, não? Pois é, mas ele sempre pensava isso. O último sempre dividia, mesmo que sua vida tivesse sido dividida em duas a uma semana atrás.


Sozinho caminhando de volta pra casa, o mundo parecia estar em outras duas perspectivas que não a normal. O que seria normal, como definir?


Já em casa, o doce toque da música, não há nada igual a uma caneca de café de fumaça sinuosa ao som das teclas de Arnaldo Baptista. “Sinto falta de mais poesia, acho que isso está faltando na vida das pessoas”. Concluiu que o caminho que tomara até ali havia se tornado acinzentado, diferente do colorido que ele visualizava no quadro da parede. Faltava uma maneira de viver com o sorriso da poesia no rosto, com mais energia de vida e espontaneidade. Faltava.


“Pra ser honesto, sou um pouquinho infeliz”.


Só que naquela manhã, o sol estava ficando alto, ele passou a se olhar pelo lado de fora e não mais de dentro, mesmo parecendo difícil de entender. Sentia como se a vida fosse uma sucessão de muitos nascer-do-sol, como capítulos da vida. Aquela manhã, sentiu como se estivesse finalizando um desses capítulos e se preparando para ver um pôr-do-sol.


Embora tenha achado a noite longa e boa, de companhia agradável, ele se sentia diferente. Na manhã seguinte equivalente do ano anterior, ele lembrava, estivera num lugar mágico e inacessível, onde o ar parecia estático e envolvido em uma música dos Beatles. Entre as duas manhãs havia se passado um ano ácido de muitos acontecimentos e dificuldades, mas muito mais de belos pôr-do-sol ao fim de tardes de primavera, mais de descobrimento, mais de música. “Não se assuste pessoa, se eu lhe disser que a vida é boa”. Tanto mudou, por que ainda se espantava com a dimensão das mudanças? Impressionante, quando vemos algo evoluir no cotidiano não percebemos, mas comparado ao ponto de partida, vemos como a caminhada foi longa, e imprevisível.


Não importa, pelo menos não ali, nem naquele dia. “Acho que quero apenas de abraçar uma pessoa querida”. E ouvir muita música. Parafraseando Raul, ouvir o som da própria voz.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Contos Cruspianos III

Naquela manhã ele não foi para casa. Quando já finalizava seu café, ouviu ao longe os auto-falantes do sindicato dos trabalhadores, dando notícia das pautas da greve que já durava sete dias. Era uma voz de senhora, um pouco rouca. Diria melhor: cansada. Cansada de tanto gritar ao longo da vida em microfones e assembléias, nas lutas sindicais. As vozes que falavam aos auto-falantes eram sempre conhecidas, pois formava-se ali os quadros que disputariam em movimentos sindicais e partidários. É a maldita estratégia de ação política por dentro do Estado.



Gabriel havia presenciado grandes acontecimentos políticos no curso de seus três anos de faculdade, mas participara ativamente das coisas apenas no primeiro ano. A corrupção, as tramoias e as disputas partidárias no interior dos movimentos sociais o haviam desanimado. Desde então acompanhara tudo que acontecia no campus, mas de longe, sem se envolver muito. Ouvindo a voz daquela senhora, pensou em quanto da vida pessoas sacrificam em prol de uma mudança radical de sociedade. Elas simplesmente não aceitam. Recusam-se a aceitar a subalternidade, a sofrer nas duras lidas diárias por pouco enquanto sustentam os ricos que consomem e esbanjam o planeta. Lutam para acordar a classe média de seu silêncio comprado barato por salários medianos e carros populares.



Foi então que ouviu o som de fita adesiva, e percebeu que alguém fazia colagem de cartazes políticos na porta do elevador. Dentro do CRUSP, desenrolava-se também a política e as disputas de poder. Apesar de suas tendências anarquistas – definição dada por outras pessoas – ele considerou naquela manhã que se envolvia pouco com o que acontecia a sua volta.



Quando saiu da cozinha para o corredor, viu quem colava o cartaz na verdade recolava. Uma moção de repúdio tirada em assembléia de moradores havia sido rasgada por uma das vizinhas. Era Roberto, o vizinho do andar de baixo, quem o restaurava, remontando o quebra-cabeça de papéis. A intenção política da remontagem estava justamente em não substituir o papel, mas em colocar o mesmo, para mostrar que apesar das oposições, ele continuaria a testemunhar o que continha em suas linhas, gostassem ou não. Ele olhava e pensava em quantas pessoas estariam se envolvendo naquelas agitações políticas por detrás daquele cartaz rasgado.



Olhando para o vizinho, pensava em como era uma pessoa peculiar, uma realidade, um outro mundo com uma história totalmente fora de sua projeção, de suas suposições. Vindo do interior, de uma vida pacata, Gabriel sabia que sua experiência de vida, que não era pouca, ainda não bastava para compreender a trajetória de Roberto e tantos outros que ele havia conhecido em três anos. As mais singulares pessoas, com as mais singulares histórias. Contudo, os cruspianos não contam suas histórias a todos, e muito do que se sabe vem do implícito. Vinham de todas as partes, tinham as mais variadas idades, eram dos mais variados tipos.



Roberto era uma das personalidades peculiares da moradia. Aparentava por volta de trinta anos, cursava ciências sociais a provavelmente seis ou sete anos, sem projeções para se formar. Era muito envolvido nas disputas políticas dos moradores estudantes; fumava muito, e já se ouviu dizer dele em devaneios que tinha suas fases, nas quais usava de tudo; ninguém sabia ao certo a alternância e freqüência das fases. Em seu rosto, viam-se as marcas de uma história de vida conturbada e difícil. A barba por fazer e o cabelo já meio grisalho não o faziam velho, apenas faziam aparentar ser muito batido para alguém da sua idade. Contudo, tinha uma personalidade jovem, ouvia rock no último volume, enchendo o corredor com o som que ia de Nirvana à Raul Seixas.



Acima de tudo, sua principal característica era uma certa energia na sua presença, do tipo que Gabriel sentia quando estava diante de alguém cuja realidade lhe era totalmente distinta. Não raras foram as vezes em que as histórias das pessoas com tal energia o chocavam absurdamente. Porém, como já dito, nem todos compartilhavam o passado, e imaginar o que outros viveram com base em fragmentos do presente para ele era ao mesmo tempo fascinante e aterrador. Fascinante pelo contato mágico com o desconhecido; aterrador porque muitas vezes conhecia faces do mundo muito assustadoras, com as quais pessoas conviviam banalmente.



Ele cumprimentou Roberto, oferecendo-lhe café, como fazia a todos os vizinhos. Aceitou. Depois de um diálogo trivial, enquanto caminhavam até a casa de Roberto, quando este lança a pergunta:



Você sabe alguma coisa de carpintaria?



Pouco. Por quê?



Preciso fazer uma adaptação em casa.



Gabriel aceitou seu convite, e foi até a casa de Roberto. Lá, pode novamente juntar fragmentos do passado obscuro e sentir o contato com o desconhecido e encoberto.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Roda Garcia

Quando eu era pequeno a minha mãe já me dizia

você tem que estudar, dar um jeito na sua vida

você vai se casar, vai ser pai de família

ser trabalhador honesto, vai ser igual seu pai queria


Mas quando você cresce, escolhe o que quer ser

ser chefe de família ou só quem vive por viver

um leva a vida leve

o outro vive pra valer


Vida de hippie risca minha razão

vida de pai de família rasga minha intuição

eu não sou obrigado a escolher agora não

eu peso as duas na balança

mas eu não acho conclusão



Pai de família:


Não levo jeito pra nada que eu gosto

eu só respeito meu controle remoto

nada me acontece mas eu nunca me importo

um emprego que eu odeio pra comprar o que eu não posso


Só posso possuir depois que eu posso ponderar

só posso executar depois de muito planejar

eu levo a vida com a barriga

depois eu vou me aposentar



Hippie:


Eu troco um troco por um treco amargo

é chá de cogumelo, caramelo com aspargo

só me levo pro lual quando me liga a loucura

só levo a vida livre porque a vida é só uma


Só quero possuir o que eu posso carregar

eu só quero ir pra onde eu não posso olhar

a vida me dá pouco tempo

e eu pretendo aproveitar




Vida de hippie risca minha razão

vida de pai de família rasga minha intuição

eu não sou obrigado a escolher agora não

eu peso as duas na balança

mas eu não acho conclusão


terça-feira, 13 de setembro de 2011

Universo

"O universo pode não ser apenas mais estranho do que supomos; ele pode ser mais estranho do que nós podemos supor."

- J. B. S. Haldane

O universo não é ideia minha

O universo não é ideia minha
a minha ideia de universo é que é ideia minha
A noite não anoitece pelos meus olhos
a minha ideia de noite é que anoitece pelos meus olhos
Fora eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
a noite anoitece concretamente
e o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso

- Alberto Caeiro

O copo e o nada




O inverso do universo

é um copo cheio de nada

porque o nada, aqui, ocupa um espaço pequeno

sem questões a serem indagadas





"De onde o copo veio?"

"Pra onde o copo vai?"





Perguntas inúteis de se fazer

afinal, o copo está cheio de nada

perguntas não fazem o nada desaparecer

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Pequena Âncora

Todos os dias eu fujo de mim mesmo
todos os dias eu acordo e não percebo
que eu perco tempo só pensando no passado
e do presente eu me esqueço

Dizem que eu fingo ou minto tudo que escrevo
dizem que eu sou fri mas não sou não
apenas sinto com a imaginação
eu não uso mais meu coração

Poeta bom não faz poesia certa
a vida é bela mas a vida é inconcreta
alguém mudou minha noção de realidade
me ensinou que a sensação é única verdade

Eu vi vislumbres do futuro e eu não gostei do que eu vi
agora eu sei como é por lá, agora eu sei que eu não quero ir
as coisas boas já não passam por aqui
restam lembranças pra eu poder sorrir
sozinho outra vez eu fui dormir

A esperança me dá asas a imaginação
vida maluca que não segue um padrão
meus pesadelos me desprendem da razão
eu tenho uma âncora pequena que me puxa para o chão
me traz de volta para o chão
pequena âncora que me arrasta
é a razão que me arrasa

Na minha vida o que era bom chegou de pára-quedas
coincidência não me mira e também não me erra
o de repente nunca vem quando você espera

Eu repasso passo a passo
eu passo o dia todo só a relembrar
que a minha âncora faz falta
mas eu posso me acostumar
eu sei que tudo um dia vai passar
vou repetindo as reticências dessa essência ao meu ver
as coisas se conseguem se consentindo que eu não consigo mais correr
essa corrida quem criou foi só você

O que vem fácil fácil vai
é o que meu pai dizia
quando a esmola é demais o santo desconfia
pequena âncora era o que eu queria
tudo que eu queria

Mas o sopro do tempo sempre me ameaça
felicidade vem, felicidade passa
pequena âncora foi embora
a lágrima presa agora rola
pequena âncora foi embora
o ruivo que ria agora chora

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Como as coisas livres a luz do sol

Arrepiou o corpo inteiro, tirou o fôlego, fez perder a hora, mudar o ritmo de São Paulo, ser turista sempre e andar no passo que eu bem quiser, olhar pro alto, falar da lua e declamar poesias ruins no teu ouvido, fumar do teu cigarro, beber da tua bebida, rir, falar falar falar sentir vontade, vontade mesmo... sabe, daquelas que dá e não passa com exclamação! sem ironia por hoje, sem sarcasmos e afins, sem fins e enfim sem pontos sem teoria sem roupas e com muito tesão!

Ana T.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Promessas de Amor

Promessas de amor são vazias
lembra daquelas que a gente fazia?
Hoje eu entendo de um jeito que eu não entendia
aprendi da vida curta das promessas
só que de uma maneira tardia

Lembra dos risos que a gente dava?
O jeito que você parava e me olhava…
eu achava que até isso era promessa de “pra sempre”
Mas não é sempre que o “pra sempre” acaba?
Por isso que hoje eu não acho mais nada

Pensando bem, qual seria a graça?
Se a gente soubesse que acabaria?
Quantas promessas de amor teríamos feito
se soubessemos que promessas de amor são vazias?

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Pomerode III



Ainda a deriva. De longe, vi as torres de uma igreja ortodoxa e conjeturei se já não estava próximo o cemitério. Foi então que outro jardim florido me chamou atenção por suas cores, era uma floricultura.
Saindo pela porta, vi uma senhora de cabelos curtos e loiros, com seus 70 anos de idade. Tinha traços mais europeus, ao contrário de João. Mas como ele, falou comigo de bom grado quando elogiei seu jardim. Era a dona Ana.
Perguntei-lhe se sabia de algum cemitério por perto. Ela sorriu e me levou então a um terreno nos fundos de sua casa, na posição que seria a frente antiga da igreja ortodoxa, local do antigo cemitério da cidade. Hoje a fachada foi mudada e esse cemitério desativado. Agora ele é um terreno baldio, com muito mato, com algumas lápides antigas, de pedra, que davam ao lugar um ar macabro. As tumbas mais recentes eram de 1927. Não faço idéia de porque aquilo ainda está ali, esquecido nos fundos de uma floricultura.
Depois de conhecer o lugar, perguntei-lhe da estátua de bronze de Erwin Curt, que eu sabia ficar no cemitério atual. Ela se dispôs a me guiar até lá.
“Conheço muito a história desse cemitério, morei aqui a vida inteira e sempre o freqüentei”. “Por causa dos suicídios?”, perguntei. Ela contou-me da veracidade dos boatos que eu ouvira: foi mesmo proibida a venda de cordas, os suicídios às vezes eram três ou quatro numa mesma família, e ninguém sabia a causa. Todos enforcados.
Tornara-se força de expressão quando, numa briga, alguém dizia: “vou sair e me enforcar”, e respondiam: “vá que te darei a corda”. Certa vez, em lua de mel, um casal brigou e o marido pediu corda a esposa. Ela deu, subestimando o marido. Na primeira manhã de casados, ela achou o corpo dele pendurado na sala.
Chegamos ao cemitério. Ficava em um terreno inclinado, de face voltada para leste, para que os mortos ficassem de frente para o nascer do sol. Era muito florido e colorido, com muitas esculturas e túmulos em pedra impressionantes. Ao entrarmos, ela me levou até um túmulo e contou-me sua história.
Era um rapaz comum, vinte poucos anos, trabalhava, era por volta da década de 1950. Um belo dia, sem mais nem menos, ele invadiu armado a residência de um casal recém-casado, no momento em que a jovem mãe amamentava o primeiro filho. Atirou na criança, o tirou atravessou-a e matou a mãe. Em seguida atirou no pai. O casal morreu ali. Em seguida ele se enforcou na sala. O crime chocou a pequena cidade. Como punição, o assassino foi enterrado de cabeça para baixo, e não pode ver o nascer do sol como os outros túmulos. Ela me mostrou outro túmulo mais a frente. Um casal, mesmo ano de morte. Era o casal da história.
“E a criança?”, perguntei-lhe.
“Trabalha ali naquele galpão, passa bem. Hoje já é um homem formado”.
Ela continuou a me contar dos túmulos. Falou-me de um caso em que um sujeito sumiu da cidade, sem avisar amigos ou família. Tempos depois, descobriu-se que fora enterrado como indigente em Blumenau. A família, ao descobrir, mandou exumar o corpo para ser enterrado em Pomerode. Quando ele chegou, a família viu que a corda usada no suicídio ainda estava ao redor do pescoço do jovem. Cortaram-na e o enterraram junto ao túmulo da família. Acreditava-se entre os familiares que o rapaz não conseguira descansar na morte enquanto a corda não fosse retirada.
Depois, Ana mostrou-me a estátua de bronze de Erwin, magnífica.
Aos poucos, enquanto ela falava e caminhava comigo pelas lápides, percebi que a atenção que me dava refletia sua profunda solidão. Enquanto ela falava, a energia do lugar parecia envolvê-la, seus olhos eram leves, suaves, distantes. Ao mesmo tempo, traziam as marcas não apagadas da dor, da qual ela se alimentava. Seus cabelos curtos e loiros caiam pelo rosto de leve, a pele já desgastada pelo curso de seus setenta anos, sendo o último ano de fato o mais difícil.
Foi então que paramos. Ela começou a acariciar uma lápide. Chorava. Contou-me sua história: perdera uma filha no ano passado, vítima da gripe suína. “Era enfermeira e morreu por ajudar os outros”, dizia. Falou também em negligência do hospital, parecia procurar sempre os responsáveis. Por fim, me contou dos meses de agonia que passou em São Paulo acompanhando o tratamento da filha. Ela acabou não resistindo, por conta de uma deficiência imunológica leve, tinha desde pequena.
Eu observava a cena percorrido por uma estranha energia. O cemitério em que estávamos era belíssimo, mas envolvido pela bruma de tristeza que pairava sobre a cidade, pela dor que emanava dela. A luz do por do sol já se anunciava; ela parecia precisar transmitir suas lágrimas, trazia em si uma angústia machadiana que me absorvia. Foi sem dúvida uma experiência intensa.
Quando retornei da deriva, cansado e com a mente fervilhando, me convenci de que tudo não passara de uma alucinação. Na manhã seguinte percebi que estava errado.




PS: O cemitério da foto é o primeiro que aparece no texto, o abandonado.

Pomerode II



Eu estava à deriva. Andava a esmo pela praça pensando onde a deriva me levaria. Acabei em frente a uma casa que me chamou muito atenção. Vi muitas esculturas em madeira, belíssimas, dispostas ao longo de um jeitoso e colorido jardim. Não parecia uma casa gigantesca, mas era como produto de artesanato, com seus traços perfeitos. Bati palmas, ninguém. Chamei, ninguém novamente. Entrei vagaroso pelo jardim e cheguei até a porta, estava aberta.
Veio ao meu encontro um senhor, magro, alto, traços muito mais brasileiros do que europeus, aparentava seus 70 anos. Conversamos um pouco, contei-lhe que estava à deriva e que me impressionei com as estátuas do jardim. Ele sorriu, e convidou-me para entrar.
Entramos em uma pequena oficina de trabalho em madeira. Havia centenas de pequenas estatuetas rústicas amontoando-se sobre prateleiras, adornando as paredes. Vi algumas peças esculpidas pela metade, outros pequenos modelos, muitas ferramentas espalhadas, e um cheiro forte de madeira. Eu estava na casa do senhor João.
O senhor João não tinha nome alemão porque na época em que nasceu nomes alemães eram proibidos no Brasil. Seu pai, Erwin Curt Teichmann, foi um grande escultor da região, vindo da Alemanha em 1913. João contou-me com orgulho das exposições do pai no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, das estátuas do pai espalhadas pela cidade, da história de sua família. No momento, ele morava sozinho na casa do pai; os irmãos casaram-se e os pais já morreram, ele acabou por herdar a casa e o acervo.
“Está vendo a aquela pequena estátua ali, na prateleira? É o modelo da estátua central da praça da cidade. Meu pai fazia pequenos modelos em madeira antes de esculpir em metal ou rocha. Sim, ele também trabalhava metais. Vê aquela outra pequena estátua, a do Cristo? É o modelo de uma grande estátua de bronze do cemitério da cidade, belíssima.”
Atravessamos a oficina e entramos em um grande saguão. Parecia tão espaçoso que pensei por um momento em não estar na pequena casa de artesanato, mas num palacete colonial alemão. Cristaleiras com porcelanas trabalhadas, tapeçarias na parede, móveis coloniais e muitas esculturas de madeira davam um brilho especial à sala. João me contava de algumas peças, muitas delas retratavam pessoas falecidas de sua família, ou figuras importantes da época do senhor Erwin. A sinestesia da sala me bombardeava de sensações. A que mais me chamou atenção foi um painel de madeira escura, em alto-relevo, que ocupava uma parede inteira, retratando a santa ceia. O verniz sobre as figura humanas fazia com que brilhassem sobre o fundo negro.
Eu ouvia a voz de João ao fundo, enquanto olhava para a obra, absorvido. Foi quando vi a sombra do braço dele se levantar, segurando uma escultura de um rosto, e me golpeou na nuca. Caí atordoado. Senti uma forte adrenalina correr meu corpo, estupefato. Enquanto ele se preparava para um segundo golpe, fechei os olhos e respirei fundo. Quando os abri, a cena tinha voltado ao normal, com João ainda falando ao fundo, eu ainda estava a contemplar o painel. Tivera mais uma pequena alucinação, provavelmente fruto do ácido que tomei meia hora antes de desembarcar na cidade. O problema era que as alucinações estavam ficando mais freqüentes com o passar do tempo. Senti-me angustiado, parece que a naquele momento passei a captar uma sensação estranha vinda de tantos rostos de pessoas falecidas impressos na madeira, me observando. A energia da sala ficou pesada. Disse ao senhor João que precisava ir, visivelmente angustiado.
Quando encerrei a visita, João me disse: “vá ao cemitério e conheça a estátua de bronze, você vai gostar”. Saí de lá já em busca do cemitério da cidade. Ao contrário de João, os moradores eram de fato pouco receptivos e não davam informações facilmente, então andei sem rumo, tentando dar seguimento a minha deriva.

Pomerode I






Já ouviu falar em Pomerode?

Trata-se de um lugar incrível. Não, não me refiro aos pontos turísticos, às confeitarias alemãs ou aos festivais gastronômicos da cidade. É algo muito além.
Deixe-me falar um pouco da cidade como comumente é vista por todos. Pomerode fica no estado de Santa Catarina, próxima a Blumenau, da qual já fez parte no passado. Em 1863, recebeu imigrantes da Pomerânia (hoje Pommernland), que ocuparam a região do rio do Testo, onde hoje fica Pomerode. Tornou-se então área de colonização alemã, durante as políticas de imigração européia empreendidas pelo governo brasileiro no fim do século XIX.
Hoje, eles vivem do turismo e algumas poucas indústrias dos arredores, como a de roupas e calçados. Há muitas edificações de arquitetura alemã, estátuas nas praças, flores coloridas pelas ruas. A pequena cidade, com suas docerias abertas, suas ruas de paralelepípedo, as torres da igreja ortodoxa, parece inteiramente de miniatura, parece alegremente receptiva. Contudo, é sabido que os moradores de Pomerode não se dão com forasteiros. Todo ar colorido cheio de graça desaparece em uma solidão fria pelas ruas sem ninguém. As poucas pessoas pela rua não conversam, não cumprimentam, dão poucas informações. Se você se muda para lá hoje em dia, dificilmente conquista a amizade de vizinhos que estão na cidade a algumas gerações.
A pouca sociabilidade dos moradores mais antigos com os “de fora” aumenta ainda mais um certo clima sombrio pelas ruas: tudo parece meio vazio, todos os olhares parecem meio de lado, fazendo jus a alcunha de povo fechado. Essa barreira aos moradores novos se reflete até mesmo no preço dos terrenos: os preços são muito altos para dificultar a compra. Os olhares vindos de janelas entreabertas parecem seguir os passos de gente de fora.
O que tornou a cidade famosa anos atrás não se relaciona em nada com seus dotes turísticos. Uma reportagem de abrangência nacional contou ao país sobre a cidade dos suicídios: Pomerode apresentava um índice de enforcamentos absurdo, considerando-se a proporção de seus poucos habitantes. Muitos casos de suicidas, e todos enforcaram-se.
Ninguém jamais soube ao certo a causa desse fenômeno, mas era fato notável. Chegou-se a proibir na cidade a venda de cordas por alguns anos, na tentativa de inibir a prática. Em nossa sociedade, matar-se é considerado crime de homicídio, mesmo que você more na cidade dos suicídios, por mais absurdo que pareça.
O fato gerou mil lendas a respeito, explicações das mais diversas partindo do esoterismo e da religião, boatos, mitos. Até mesmo algumas gírias e expressões populares se firmaram em torno dessa “cultura” local. Hoje o número de suicídios caiu, embora ainda aconteça, e todo o conjunto de histórias parece parte de um passado perdido, esquecido, e talvez propositadamente enterrado vivo pelos moradores de Pomerode.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Contos Cruspianos II

Gabriel


Lá estava ele a fazer café. Como todos os dias, ia até a cozinha pela manhã e passava seu café já adoçado, com os mesmos apetrechos contendo as mesmas medidas dos mesmos ingredientes: pó de café, marca Pilão a vácuo; açúcar, da marca mais barata; meia caneca de leite, para ser preenchida depois com café; um baseado cuidadosamente bolado ao som do piano de Arnaldo Baptista.
Enquanto ele bebia seu café e fumava seu cigarro, viajava por assuntos dispersos com o pensamento. Gostava de liberar a mente de qualquer preocupação, deixa-lá fluir naturalmente por onde bem quiser ir. Sentia que esse era seu primeiro hábito diário mais ritualístico, do qual gostava muito e desagradava-lhe quando não podia realizá-lo. Dizia a pessoas próximas que, no curso dos seus vinte e quatro anos, nunca tinha percebido algum indício de que envelhecera, até reparar nesse costume matinal que tanto lhe trazia autoconhecimento.
As cozinhas eram coletivas e ficavam no fim do corredor. Lá a vista era bela, apesar de mascarar o caos da urbanidade acelerada. Ele costumava mais olhar a outra janela, que dava para as árvores. Pinheiros se misturavam por entre um grande gramado sortido de outras árvores de copa, alguns pés de amora, e o esboço do que seria uma horta coletiva para os estudantes.
Quanto terminava, ia para casa. Era muito acusado pelos amigos de só ouvir Mutantes, o que de fato ouvia muito. Mas muitas manhãs foram cativadas com o som de Arnaldo Baptista, Rogério Duprat, Caetano Veloso, Raul Seixas, Beatles, entre outros representantes das décadas de 60 e 70, os anos nos quais ele acreditava estar seu coração, brincando algumas vezes de que nasceu na época errada. Muitas vezes tocava violão e compunha músicas que só ele ouviria, por puro prazer de criar. Muitas se perderiam para sempre nas areias do tempo. O que gostava mesmo, era de abrir as janela e sentir o sol entrar no quarto, quando então pegava o livro de Gabriel Garcia Marques e perdia-se por entre as páginas, absorvido.
Gabriel era uma pessoa singular. Era jovem, mas entrou com idade um pouco acima da média na faculdade. Cursava geografia e era adepto da teoria da deriva, dos situacionistas. Sua paixão por escrever o guiaria por mil memórias e relatos de suas andanças sem rumo pelo Brasil afora, “derivando” aqui e ali. Tinha amigos e conhecidos em toda parte, sabia de tudo um pouco e no fundo sentia que não sabia era nada.
Gabriel era ao mesmo tempo um sonhador sem causa e um cético niilista. Gostava de definir-se como metamorfose ambulante, de passar por mil religiões, filosofias, políticas e lutas. No fundo, estava mergulhado numa eterna busca por algo que não sabia bem o que era.

Contos Cruspianos I

Olá, tudo bem? Que bom que chegou a tempo para o café. Sente-se, fique a vontade. Se importa se eu fumar?
Imaginei que não.
Pelo que entendi ao telefone, você deseja gravar minhas memórias para uma pesquisa de histórias de vida dos estudantes que passaram pela moradia da USP, certo? Espero que tenha muitas fitas para gravar, pois, apesar de minha péssima memória, tenho muito a contar da época em que morei por lá. Pegue um pouco mais de café, daqui a pouco colocarei água no fogo novamente.
Bom, como posso começar?
O Crusp, Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo, era ainda em 2010 um lugar interessante de se viver. A história do residencial era incrível: as instalações foram construídas para ser moradia provisória dos atletas do Panamericano de 1968, e seriam demolidas após o evento. Um grupo de estudantes ocupou os prédios e exigiu-os como espaço de moradia estudantil. Dos doze blocos de seis andares originais, restaram sete, do A ao G. Dois tornaram-se reitoria, três foram demolidos. Assim se deu a origem do palco de muitos eventos da história do país. Foi foco de resistência durante a ditadura, escondeu líderes, promoveu assembleias, foi invadido pelo exército.
Acima de tudo isso, o Crusp era palco das mais peculiares personalidades que se poderia encontrar. Impregnando de memórias as paredes dos mais de mil quartos, as mais interessantes histórias de vida convergem em um único lugar.
Não era incomum que o Crusp recebesse a alcunha de lugar de loucos, e tinham lá sua razão. Contava-se entre os cruspianos, com ar de certeza, que “uma pesquisa” constatou que os “níveis de insanidade” entre os moradores eram altíssimos, considerando-se a proporção. Bastava então cruzar com algum maluco no corredor e o cruspiano acendia com a cabeça, mostrando que estava certo.
Fora talvez algum grau de loucura, muitos tinham em comum o fato de fugir de um meio de pobreza para entrar no meio acadêmico, ainda que fosse pela porta dos fundos. Mesmo que em muitos níveis e graus variados, o que tornava os cruspianos próximos era justamente o objetivo comum de progredir além das possibilidades que lhe ofereceu a família, de viver a universidade que para eles não fora reservada. No fundo, todos pareciam sentir-se como peixes fora d'água, que não pertenciam totalmente aquele meio, àquela realidade tão distinta da que viveram na adolescência.
Era assim então que eu vivia, desfrutando de um mundo novo, vivendo ao sabor do vento. Pude então conhecer o multi-universo de personalidades e histórias que conformavam as paredes do Crusp. Foi assim que conheci alguns dos mais singulares, outros dos mais perigosos, alguns dentre os mais interessantes, muitos dos mais intrigantes. Por escolha totalmente “aleatória”, vou contar-lhe a história de Gabriel.

Diálogo entre Aldous Huxley e Timothy Leary

Em 1960, um diálogo entre Aldous Huxley e Timothy Leary:
-...Todas essas drogas cerebrais produzidas em massa nos laborátórios provocarão mudanças enormes na sociedade. E isso vai acontecer independentemente de mim ou você. Tudo o que podemos fazer é espalhar a notícia. O maior obstáculo para a evolução, Timothy, é a Bíblia.
- Não me recordo de nenhuma discussão sobre drogas cerebrais na Bíblia.
- Você se esqueceu dos primeiros capítulos de Gênesis? Jeová disse para Adão e Eva : ‘Eu contruí esse refúgio maravilhoso a leste do Éden. Vocês podem fazer o que quiserem, exceto comer do fruto da árvore da Sabedoria’.
- Foi a primeira substância controlada.
- Exatamente. A Bíblia começa com uma lei antidrogas.

Sambinha

Pois é...

Eu queria ver de fora
como estava seu rosto quando você foi embora
Só sei quão sozinho me senti lá dentro
quão vazio que tudo ficou
e me agarrei ao que restava do seu cheiro
na blusa que você deixou

É bobagem eu já sei disso...
é cada coisa que eu invento
É bobagem eu já sei...
é cada coisa que eu invento

Mas de fora eu vi que a vida
é bem mais que um lamento
mas se a vida é sem você
eu prefiro o esquecimento
não ter mais o seu sorriso é uma vida de tormento
mais um pouco eu não aguento

Meu bem, por isso estou voltando
por favor, esteja em casa
que hoje eu quero conversar
que é pra gente conversar

terça-feira, 24 de maio de 2011

Sexo, nossa cura




To sentindo ultimamente, de maneira inconsciente,
que o mundo simplesmente anda meio bagunçado
parece que a inércia inlfuencia nossa mente
que todo mundo consente em não parar de ficar parado

Sonho tá virando rima
a morte virando menina
o futura tá virando a esquina

a noite tá virando almoço
homem de terno tá virando moço
minha boca beija o seu pescoço (ops!)

Tem índio até incendiando a prefeitura
e o sexo sendo a nossa cura
ser livre é não ser mais que um exercício da loucura
e o sexo sendo a nossa cura

Beleza, tristeza, pobreza
agora é papo de maluco
Raul, maracatu, eles e tu
agora é um bando de maluco
sendo assunto de escola, sendo objeto de estudo

Economista virando poeta
tem carro até virando bicicleta
e toda hora sendo a hora certa
(agora é a hora hein!)

Tem índio até incendiando a prefeitura
e o sexo sendo a nossa cura
ser livre é não ser mais que um exercício da loucura
e o sexo sendo a nossa cura


Senhor F.
Participação mais que especial: André Andere

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Juízo



Já não me cabe ser perfeito
eu já cansei de me esforçar
eu vou mostrar do que eu sou feito
te dar a verdade só pra variar



Sei que as vezes o certo é estreito
sei que sobra voz, sei que falta o peito
sei que ser perfeito sempre foi tentado
mas de tanto tentado é que nunca foi feito


Se me compro ou te consumo
se eu fico ou se eu sumo
se eu não sei se não, eu não sei por quê



Se estagno ou se decolo
se sorrio ou preciso de colo
nós não somos eu, nem somos você






Tento ser assim como se dissesse:
Ai meu deus! Um deus sem “d” e sem “s”
de tanto se promete logo a gente se esquece que:
Liberdade Se Demora levantar, Logo Se Desaparece



Não vou me sentir sozinho
se você seguir seu caminho
não digo que sim, nem que não, nem preciso
tudo bem, pode ir, vá com deus!



e juízo...

Os Lírios



Os Lírios

Alinho o aluguel da minha lucidez
alienado eu sou
alheio a tudo isso, eu não ligo, passo a vez, aplaudindo a quem ficou
aliendado eu sou
Altero o alcance da minha estupidez
aumento a minha dor
Eu acato as decisões que o acaso me impõe
aliendado eu sou

A sorte me visitava só pra rir de mim, veio cortar as relações
o devaneio veio aqui e rompeu percepções
e o azar veio somar-se às minhas equações
nublar concepções
O acaso repetia à risca sempre o mesmo resultado
o azar não joga dados onde eu os possa ver
e eu hoje acho graça, faça o que se faça
o futuro é uma charada que eu não posso responder

Eu adoro o inesperado, o impossível, o intocável, inconscientemente
me fascina tanto quanto me estressa a rotina que nubla minha mente
inesperado, inteligível, até inimaginável, memorável,
mas não é tudo que se sente

Parece que o passado nunca passa por aqui
pareço descuidado, distraído, alienado,
eu sei que sou assim, já faz parte de mim,
o acaso é debochado e me acompanha até o fim
alienado eu sou, é tudo que restou,
revejo os meus conceitos de uma vida que mudou
a sorte acabou, alienado eu sou

Shakespeare e o malabarista

Ele estava sentado, e já fazia tempo demais para a pequena paciência com que havia acordado. Burocracia. Como odiava escritórios. O ambiente mais opressor possível, símbolo do desperdício das potencialidades humanas. Olhava a atendente por detrás da mesa, ela com seus olhos fixos no papel, enquanto o ruído do lápis se desfazendo parecia ensurdecê-lo. Os ponteiros do relógio pareciam dele zombar, passando mais devagar do que o de costume.
Deixou sua mente divagar por um pequeno instante, olhando o sol lá fora, notando a cor mais forte que a grama exibia naquela manhã. Reparou, no canto direito da janela, um elemento a mais na visão distante: um malabarista treinava manobras com uma bola de vidro brilhante, que refletia os raios de sol e parecia feita de luz. O diretor dos movimentos da bola parecia a ela ligado, enquanto suas mãos deslizavam pelo ar parecendo mal tocar a bola de luz que quase flutuava. Os cabelos desgrenhados e soltos, a barba ligeiramente grande, as roupas coloridas, as pulseiras e o colar cabalístico davam à cena um ar peculiar demais para se descrever apenas com palavras.
Novamente, ele olha por cima da mesa. Parece que está mais longa, ele portanto está mais distante da atendente, que agora olha para tela de um computador. Parece mais querer ignorá-lo do que executar alguma função enquanto lê a tela. Ele fecha os olhos, inclina de leve a cabeça e coça o olho, a cena típica de cansaço mental. Sente-se desperdiçando-se naquela cadeira; desperdiçando a si mesmo.
Ele então escuta palavras sussurradas, ditas em um ritmo suave. Olhando para a mesa ao lado, ele vê outra atendente, uma jovem japonesa, não mais de dezoito anos. Seus cabelos lisos caíam de leve nos olhos. Seu sorriso era tímido, mas parecia conter mais do que apenas esse aspecto de sua personalidade. Debruçado, com os cotovelos em sua mesa, estava o autor das palavras sussurradas: um garoto jovem como ela, de pele tão clara que parecia ser sensível ao sol, contrastando forte com seus cabelos e olhos totalmente escuros. Seus traços do rosto eram desenhados em linhas suaves, com um óculos discreto também de linhas finas e suaves. Parecia deliciar-se enquanto segurava um livro aberto diante de si: poemas de Shakespeare. Lia para ela em inglês, depois, sem ler, o recitava traduzido. Olhava-a nos olhos, e recitava bem baixo, para não romper o silêncio ensurdecedor daquele escritório; este direito era reservado apenas aos telefones que tocavam a cada cinco minutos.
Ele tenta escutar alguma frase do poema, mas a cena o encanta, e ele não consegue distinguir bem as palavras. Impossível não pensar em como frases de Shakespeare soltas no ar voavam pelo escritório, em como o malabarista lá fora manipulava a bola de vidro cheia de energia, e em como a atendente sequer pisca diante da tela, ignorando completamente a vida ao seu redor.
A atendente a sua frente retira uma papel, carimba-o com mais força do que o necessário, assina um visto rápido e lhe entrega. Ao sair da sala, pensa se Shakespeare já escreveu algum poema sobre um malabarista. Ou sobre um casal no local de trabalho, que trocam olhares fugidios e poemas sussurrados com sorrisos. Não. Talvez Shakespeare tenha escrito apenas uma crônica a respeito.

Realidades no Plural



"Acho que eu o vejo tocar. Talvez imerso em luz colorida. Ele no órgão, olhando para o outro, tocando guitarra, e ela cantando. É sinestésico, é envolvente, é colorido, é inebriante.”



Exagero? Quem te garante…?



É, acho que existe um outro mundo, rapaz. Talvez uma outra dimensão. Talvez não, com certeza, mas não a absoluta. Cara, diziam os filósofos que a realidade não é nada mais do que informações enganosas dos nossos sentidos. Platão falava do mito da caverna, lembra? Se eu falasse em Matrix, talvez te fizesse rir, certo?
Mas, ignore a ficção e tente responder o mais sinceramente possível à questão central do filme: se você estivesse num sonho e não conseguisse acordar, como saberia a diferença entre o mundo real e o mundo dos sonhos? São as velhas questões de volta.
É, acho mesmo que existe um meio de se acessar uma outra realidade, dimensão, o que for não importa, e ver tudo do modo como descrevi. Você, infelizmente, nunca vai saber do que se trata, mas saiba que muito do que você conhece e gosta foi feito assim, por pessoas assim. Eram tão parte dessa “outra dimensão” de que falo, que foram considerados gênios. Alguns eram tão de lá que parecem que fizeram o caminho inverso: vieram de lá pra cá, como foi o caso agora. Outros ficam por lá mais tempo do que por aqui, curiosíssimo não?
Não se trata apenas de um efeito, meu caro, mas uma forma de acesso à outra realidade ainda por desvendar, algo simplesmente tão fantástico que fica difícil descrever, e sinto em dizer que tais experiências são simplesmente intransferíveis. Triste verdade, não?
Agora, digo mais especificamente da música, é algo simplesmente fantástico, mas de um acesso muito restrito. Estranhou? Acredito que ouvir música muita gente ouve, mas sentir a música tão profundamente que até os sentidos táteis não se comparam à sensação produzida, isso já é ligeiramente mais raro. Que bom que ainda acontece hoje em dia, pois já cheguei a acreditar que talvez a música estivesse morta e que só restavam as heranças do passado. Estou em vias de rever essa posição, ainda não me decidi a respeito.
Ah, não mudemos de assunto, certo. Aliás, quer saber? Assunto encerrado. Não vou ficar mais argumentando, por três motivos. Primeiro, não quero mesmo mudar sua opinião, sou pouco samaritano nesse sentido e admito. Segundo, porque você deve ter notado que uso muitos “talvez” quando falo (se quiser, volte e conte no texto, mas esse entre aspas não conta). Isso demonstra que sou uma pessoa de pouca certezas e acho isso uma virtude. Diz uma frase do Raul: “você não tem perguntas pra fazer porque só tem verdades pra dizer”, e assino embaixo. E finalmente, terceiro, você está me fazendo perder a melhor parte da música!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Modernidade




Momento diferente, escuro e entorpecente

presentes e ausentes a normalidade

e a nossa banalidade

mas lá fora, na babilônia dessa cidade

tudo flui acelerado, sinto o mal estar da modernidade

tudo flui acelerado, é a modernidade

Baudelaire já me dizia, é a modernidade




Ao meu redor tento imaginar uma natureza, que talvez não exista

E quem pode me julgar, me chamar de idealista?

O futuro veio e me levou cativo

e parece ter passado o tempo das revoluções

Sob regras que eu não criei eu vivo

e tento me consolar num mercado de ilusões


E tento me consolar na modernidade...









PS: A primeira metade da primeira estrofe foi escrita coletivamente por um grupo de geógrafos ilhados numa república durante o última grande blecaute em São Paulo. As conversas daquela noite, o som que fazíamos, as pessoas, tudo isso inspirou a composição dessa música.

Se um dia eu descorbir como postar arquivos no blog, posto essa música.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

No Trabalho

Sabe aqueles dias em que você acorda inquieto? Você não quer passar o dia sentado numa cadeira de escritório. Nada te tira da cabeça que a vida é mais do que isso.Você então respira fundo, se espreguiça na cadeira, bebe a décima caneca de café do dia, buscando um pouco de felicidade no açúcar. Claro que não encontra. E a cafeína só serve pra te deixar mais inquieto, com vontade de sair correndo apenas e simplesmente. Mas não o faz. Fica olhando pra caneca de café enquanto esfria.
Vamos lá. Volte ao trabalho. Não porque você queira que seu departamento realize mais, não que faça algum sentido lutar por algo que você nem sabe ao certo se concorda, nem mesmo que você ache que sua função é necessária pra que as coisas funcionem. Não é. Nada parece fazer sentido, mas voltar ao trabalho ajuda a passar o tempo mais rápido.
No trabalho, o tempo se arrasta.
Não, não fique olhando pro relógio. Assim o tempo passa ainda mais devagar. É, é muito tempo da vida pra se perder aqui. O dia lá fora está lindo. Num dia de 24 horas, dormimos oito e trabalhamos oito, todo o resto fazemos nas outras oito. Nosso tempo curto é dividido em três partes eqüitativas, dormir, trabalhar e o resto da sua vida. Um terço da vida, passaremos trabalhando, outro dormindo. São apenas doze horas em média de sol por dia. Menos as oito de trabalho que são durante o sol, vezes uma vida toda, dá.......... A matemática me deprime mais que a falta de sol.
Agora pare de ficar olhando esse cursor piscar na tela. Faça algo. Faça logo porque até eu estou ficando desesperado aqui só de ficar assistindo você, ridiculamente inquieto e ridiculamente quieto.
Sim, agora sim. Andar até o fim do corredor, abrir a janela, sentir um pouco do dia que se passa lá fora sem você. Andar desperta, o dia refresca, e você quer estar consciente no seu algo a realizar.
Talvez o último. Talvez porque, antes de atingir o chão, ainda passe em alguns segundos toda sua vida diante dos seus olhos. Não sei ao certo se isso é verdade, minha experiência de quase-morte não teve direito a flash back, então comecei a desconfiar dessa história.
Mas faça o que tem que fazer. O que importa são os fatos. A tal paixão dos suicidas sem explicação. Como não tem explicação? Olhe a sua volta. Que lugar deprimente, imerso numa sociedade sem sentido, o sol lá fora não dava a cara a três dias e agora que ele está lá você não pode sentí-lo.
Não pode, não pode, não pode.
Convenções sociais, controle. Como não tem explicação?

...

Nossa. Não é que ele pulou mesmo?

Crônica do Cronista




Ele estava parado, diante do computador. Olhava para a tela e pensava em escrever uma crônica.


A crônica que estava em sua cabeça era a seguinte: ele teria uma vizinha, que conheceria todos os seus gostos musicais devido ao hábito dele de escutar música alta. Ele a encontraria no elevador, levando lixo reciclável. Então, ela comenta sobre o evento de agosto dos fãs de Raul em São Paulo e pergunta se ele vai. Ele questiona o porquê da pergunta e os dois entrariam num debate musical acerca de Raul Seixas com base nas informações trocadas via paredes de vizinho. O texto seria de frases curtas e rápidas a là Fernando Veríssimo, temperado com piadas internas para os bem fãs de Raul, causando aquela sensação de identidade com o texto. A crônica seria mesmo um sucesso.


Então ele saiu até a escada de incêndio, ao ar livre, e pensava em sua crônica, no que escreveria. Deixou-se levar pela paisagem e pela brisa suave daquela noite; estava fria, porém extremamente convidativa, por ironia. Com seus sentidos aguçados e suas percepções ampliadas, em boa parte devido a visão magnífica da São Paulo noturna vista daquela altura, viu-se imerso no ambiente com todos os modos possíveis de percebê-lo. De pensar em crônicas, pensou na pessoa do cronista. Tantas visões são possíveis, como uma cronista pode retratar uma só realidade se existem tantas? E se o cronista tiver mais de uma visão da realidade, ou não ter, mas ter consciência de que sua realidade é apenas um pequeno ponto de vista, ditado por seus enganosos sentidos limitados? Em poucos segundos, esqueceu-se totalmente da idéia original da crônica e passou a olhar, da escada de incêndio, a cidade iluminada. De quantas formas é possível pintá-la em um quadro? E em um poema ou uma crônica? Enxergamos todos a mesma coisa? Como se confirmar isso...? Será que existe alguma pessoa que é capaz de perceber mais de um tipo de realidade ao mesmo tempo? Acho que isso geraria um terceira, não? Aliás, não acredito que esse tipo de coisa siga nosso sistema de catalogação por unidades indivisas, usado para contar bois ou figurinhas. Talvez exista um número certo de realidades, mas talvez seja um número que não pode ser expressado ou abstraído pela mente humana, pois somos incapazes de percebê-lo e torná-lo uma idéia. Ou talvez não existam os números. Número existe?


O pensamento seguinte foi o mais óbvio: por que de pensar em crônica, pensou em cronista e de cronista, nas suas possíveis visões, e de suas visões às dimensões da existência? Como podem ser tortuosos os caminhos que o cérebro traça as vezes... Aliás, tudo, no fim, é apenas uma trilha de nosso cérebro, um impulso elétrico. Sim, nosso acesso à realidade se dá por meio de sentidos, que mandam sinais elétricos para o cérebro e esses sinais percorrem caminhos do sistema nervoso. Porém, e se em vez de ele utilizar os caminhos habituais, ele usar outras vias para se chegar ao mesmo destino, seriam os objetos percebidos da mesma maneira?


No fim, não teve dúvidas. Entrou, sentou-se, e escreveu. Fez uma crônica sobre o cronista: esta crônica.